Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República,
Sou uma aluna que frequenta o 12.º ano de escolaridade, no Curso Científico-Humanístico de Ciências-Tecnológicas, na Escola Secundária Dr. Augusto César da Silva Ferreira, de Rio Maior. Sou também Presidente da Associação de Estudantes, representante dos alunos, os quais se sentem representados nesta petição. Esta petição tem como objetivo demonstrar o desagrado de todos nós, estudantes, que lidamos diariamente com os manuais digitais, pelo que considero que a nossa opinião deve ser ouvida. Afinal, somos nós que somos confrontados com as consequências deste projeto e que realmente podemos dizer como funciona esta implementação na prática.
A minha turma faz parte do projeto-piloto da implementação dos manuais digitais e, por isso, desde o 10º ano que lidamos com esta realidade. Temos plena consciência de que a tecnologia tem muitas potencialidades para a aquisição de informação. Os recursos digitais são, sem dúvida, uma mais valia para a educação, tornam a aprendizagem mais dinâmica, sendo, portanto, uma boa ferramenta tanto para uso em sala de aula, como para estudo autónomo. No entanto, as vantagens da digitalização do ensino não vão muito além disto. Por considerarmos que os aspetos negativos superam, e muito, os positivos, passamos a enumerar alguns, dos muitos, aspetos negativos:
Impacto ambiental - é logo uma das primeiras “vantagens” que são apontadas para se justificar a opção pelos manuais digitais, no entanto, esta é facilmente desconstruída. Os manuais digitais requerem um aparelho eletrónico, tablet ou computador, que traz desequilíbrio ao meio ambiente, seja na sua produção, uma vez que são necessários recursos naturais não renováveis, compostos químicos e libertação de gases poluentes, seja no seu descarte que, se for incorreto, devido aos metais pesados (como o chumbo, o mercúrio e o berílio), gera problemas a nível da contaminação das águas subterrâneas, cadeia alimentar, fauna e flora. É verdade que os livros físicos também implicam o abatimento de árvores, levando à desflorestação que, por sua vez, leva a outra grande lista de impactos ambientais. Tendo isso em conta, sugere-se a “economia circular”, como se tem feito desde há alguns anos a esta parte.
Implicações na saúde humana - o uso de manuais digitais aumenta os problemas físicos e cognitivos nas crianças, principalmente no que respeita a doenças oftalmológicas.
Dificuldade de personalizar e fazer apontamentos - uma das melhores formas de fazer um estudo ativo é através de anotações. Este método torna-se bastante mais difícil quando os alunos o têm de fazer de forma digital. É certo que as plataformas oferecem ferramentas para tentar substituir o lápis: podem sublinhar, desenhar e fazer caixas de texto, mas estas ferramentas são bastante difíceis de manusear, demora-se mais tempo a usá-las e os apontamentos não ficam tão bem organizados como no papel. É do domínio geral que estas atividades físicas ajudam na compreensão e retenção de informação.
Distrações - os dispositivos digitais oferecem muitas distrações, como redes sociais, jogos e outras aplicações. Os alunos acabam por desviar o foco dos manuais para outras atividades não relacionadas com a escola, prejudicando o seu desempenho académico.
Além disto, vejamos exemplos de alguns dos países mais desenvolvidos da Europa:
Suécia- Há mais de uma década que foram implementados os manuais digitais neste país. Desde então, tem-se notado um declínio da curiosidade e vontade de investigação nos alunos, que foi substituído pela dependência do rápido acesso à informação. Esta forma de ensino, que se estendia aos jardins de infância, através dos tablets, traduziu-se na diminuição das competências de literacia dos alunos, provado através do estudo referido no relatório Progress in International Reading Literacy Study (PIRLS). Por sua vez, as Ministras da Educação e da Cultura, críticas à abordagem hiperdigitalizada da educação, anunciaram os planos para regressar à forma de ensino tradicional, voltando aos manuais impressos e dedicando mais tempo à prática da leitura silenciosa e da caligrafia.
Países Baixos- A partir de 1 de janeiro deste ano, os alunos dos Países Baixos deixaram de poder levar telemóveis, tablets e smartwatches para as escolas, numa medida de “proteger os alunos” das distrações inerentes aos dispositivos tecnológicos. Estes dispositivos acabam por estar tão enraizados no quotidiano dos alunos que se tornavam em constantes distrações para eles no ambiente escolar.
Tendo tudo isto em consideração, somos adeptos do lema: “Recursos Digitais Sim, Manuais Digitais Obrigatórios Não!”
Outro ponto que consideramos essencial abordar é a transição digital dos exames e provas de aferição nacionais. O presidente do IAVE, Luís Pereira dos Santos, garante que este sistema promove uma “maior equidade entre os alunos” e vantagem na correção das provas. Se querem facilitar o trabalho aos professores, sugiro que ouçam primeiro as suas queixas, que, certamente, não são relativas às provas nacionais. Reforçamos que trabalhar digitalmente não é prático e isto aplica-se a todas as disciplinas, não só à Geometria Descritiva A, que seria uma das exceções deste modelo. Nas provas de línguas, os alunos precisam de sublinhar e fazer anotações. Nas áreas das Ciências e Economia, os alunos, ao analisar gráficos e tabelas, também precisam de “rabiscar” os seus pensamentos. Estas ferramentas que nos ajudam a nós, estudantes, a ver de forma mais clara as questões, não seriam possíveis com a aplicação de provas digitais.
Portanto, é tempo de terem em conta a opinião, informada e fundamentada, daqueles que sofrem o impacto direto das medidas superiormente emanadas. Não há rigorosa base científica que as valide. Se o Ministério da Educação acredita que, por sermos a “geração da tecnologia”, estamos recetivos a implementá-la tantas horas por dia, de maneira involuntária, está enganado.
A escola existe para nós e por nós, por isso consideramos que devemos ter uma palavra sobre ela. Não cometamos o erro de outros países que, arrependidos, estão a regressar ao ensino tradicional. Aproveitemos a “vantagem” que nos foi dada e transformemos o atraso em virtude.
Ao redigirmos esta petição estamos a dar uma oportunidade aos alunos de terem uma voz ativa e consciente, em que a sua opinião é ouvida, com a oportunidade de se reverem no melhor método de aprendizagem, de maximizarem o foco e de terem apontamentos mais eficientes.
Note-se que não pretendemos uma abolição radical do ensino digital. Apenas queremos escolher como estudar, aproveitando as ferramentas digitais que temos ao nosso alcance, mas fazendo-o de uma forma tradicional.
Com esta petição, o que pretendemos é o fim dos manuais e dos exames/ provas nacionais digitais obrigatórios.
“Recursos Digitais Sim, Manuais Digitais Obrigatórios Não!”
Petição 16/XVI/1
Petição - Arquivada
Subscritor(es): Leonor de Paiva Tomaz
Primeiro subscritor: 1
Assinaturas entregues: 0
Assinaturas online: 32
Total de assinaturas: 33