Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
Exposição de Motivos
Na sequencia da apresentação do Plano de Ação para as Migrações o XXIV Governo Constitucional, uma situação de incerteza e injustiça instalou-se na vida de milhares de pessoas migrantes que já encontravam em Portugal seu local de residência e trabalho habitual.
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 37-A/2024, de 3 de junho, o qual promoveu a décima quinta alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, foram revogados os n.os 2 e 6 do artigo 88.º e os n.os 2, 4 e 5 do artigo 89.º do diploma alterado, extinguindo os processos de Manifestação de Interesse.
Neste sentido, com o pleno vigor do artigo 87-A da Lei de Estrangeiros (Lei n.º 23/2007, de 4 de julho), não há razão atendível para indisponibilidade de acesso aos cidadãos da CPLP isentos de visto para entrada em Portugal, em solicitar o referido título de residência da CPLP nos termos da lei vigente, facto que cria distinções e injustiças entre os cidadãos da CPLP, nomeadamente, entre aqueles que possuem visto de curta duração emitido por um consulado português, e aqueles que não o possuem em razão do acordo para isenção de visto para entrada legal.
Artigo 87.º-A - Autorização de residência para cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
1 - Os cidadãos nacionais de Estados em que esteja em vigor o Acordo CPLP que sejam titulares de visto de curta duração ou visto de estada temporária ou que tenham entrado legalmente em território nacional podem requerer em território nacional, junto da AIMA, I. P., a autorização de residência CPLP.
2 - A concessão da autorização de residência prevista no número anterior depende, com as necessárias adaptações, da observância das condições de concessão de visto de residência e de autorização de residência CPLP.
3 - Nos casos previstos no número anterior, para efeitos de emissão da autorização de residência, os serviços competentes consultam oficiosamente o registo criminal português do requerente.
Salienta-se que este registo não é possível neste momento, uma vez que existe um bloqueio no sistema informático de registo da CPLP, conforme se verifica na imagem destacada.
IMAGEM NO PDF (anexo)
Não obstante o exposto, o CPA (DL n.º 4/2015, de 07 de Janeiro), determina que a administração pública eletrônica deve se reger por aspectos de disponibilidade e acesso, facto que não se verifica na questão:
Artigo 14.º - Princípios aplicáveis à administração eletrónica
1 - Os órgãos e serviços da Administração Pública devem utilizar meios eletrónicos no desempenho da sua atividade, de modo a promover a eficiência e a transparência administrativas e a proximidade com os interessados.
2 - Os meios eletrónicos utilizados devem garantir a disponibilidade, o acesso, a integridade, a autenticidade, a confidencialidade, a conservação e a segurança da informação.
3 - A utilização de meios eletrónicos, dentro dos limites estabelecidos na Constituição e na lei, está sujeita às garantias previstas no presente Código e aos princípios gerais da atividade administrativa.
4 - Os serviços administrativos devem disponibilizar meios eletrónicos de relacionamento com a Administração Pública e divulgá-los de forma adequada, de modo a que os interessados os possam utilizar no exercício dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, designadamente para formular as suas pretensões, obter e prestar informações, realizar consultas, apresentar alegações, efetuar pagamentos e impugnar atos administrativos.
5 - Os interessados têm direito à igualdade no acesso aos serviços da Administração, não podendo, em caso algum, o uso de meios eletrónicos implicar restrições ou discriminações não previstas para os que se relacionem com a Administração por meios não eletrónicos.
6 - O disposto no número anterior não prejudica a adoção de medidas de diferenciação positiva para a utilização, pelos interessados, de meios eletrónicos no relacionamento com a Administração Pública.
Ademais, não há disponibilidade para o referido registo eletronicamente (conforme exposto), tão pouco por meios materiais não digitais, facto que implica em restrição ao acesso, de forma discriminatória, diferenciando um cidadão CPLP que ingressa em Portugal, com um visto de curta duração, daquele que ingressa para curta duração ao abrigo da isenção de visto.
Deste modo, quando for disponibilizado pelo governo, poderá por exemplo, um cidadão brasileiro fazer o registo e solicitar a Residência CPLP, de forma simplificada, no entanto, neste momento, tal registo é indisponível a estes cidadãos em razão do bloqueio já identificado no sistema.
Até o dia 3 de junho de 2024, tal situação não foi uma violação tão aparente, face a existência do processo de Manifestação de Interesse.
No entanto, após a extinção destes processos, diversos cidadãos brasileiros que já estavam a trabalhar em Portugal (e não tinham ainda todos os documentos para o registo da sua manifestação de interesse), tiveram inviabilizada a oportunidade de uma regularização, pelo que, tal facto merece correção.
Há rumores de que o governo em seu Plano de Ação para as Migrações, pretende disponibilizar tal acesso ao Portal da CPLP para cidadãos não portadores de visto consular, no entanto, salienta-se à possibilidade de que o governo não tem prazo para fazer esta disponibilização.
Deste modo, milhares de cidadãos estão hoje irregularmente em Portugal, muitos inclusive em uma situação “não estatística”, vez que sequer existe um processo ou conhecimento da sua existência no país.
Recorda-se ainda que a maior comunidade migrante presente no país, é justamente a brasileira, que vive bem integrada, e tem relações culturais e linguísticas de grande similaridade com Portugal; e é esta comunidade injustificadamente a mais atingida.
Não obstante o exposto, esta situação ainda pode concluir-se em um cenário de diversas coimas e contraordenações contra migrantes e empregadores, que hoje podem estar a violar a lei, sem sequer ter condições de evitar tal irregularidade.
Isto por que a Lei de Estrangeiros, prevê uma série de medidas em desfavor de quem exercer a atividade de forma independente, ou daquele que usar da mão de obra, quando o estrangeiro não estiver na posse de uma autorização de residência, ou visto de trabalho adequado.
Artigo 198.º - Exercício de atividade profissional não autorizado
1 - O exercício de uma atividade profissional independente por cidadão estrangeiro não habilitado com a adequada autorização de residência, quando exigível, constitui contraordenação punível com uma coima de (euro) 300 a (euro) 1200.
2 - Pela prática das contraordenações previstas no número anterior podem ser aplicadas as sanções acessórias previstas nos artigos 21.º e seguintes do regime geral das contraordenações.
Artigo 198.º-A - Utilização da atividade de cidadão estrangeiro em situação ilegal
1 - Quem utilizar a atividade de cidadão estrangeiro não habilitado com autorização de residência ou visto que autorize o exercício de uma atividade profissional subordinada, fica sujeito à aplicação de uma das seguintes coimas:
a) De (euro) 2000 a (euro) 10 000, se utilizar a atividade de 1 a 4 cidadãos;
b) De (euro) 4000 a (euro) 15 000, se utilizar a atividade de 5 a 10 cidadãos;
c) De (euro) 6000 a (euro) 30 000, se utilizar a atividade de 11 a 50 cidadãos;
d) De (euro) 10 000 a (euro) 90 000, se utilizar a atividade de mais de 50 cidadãos.
11 - Se o infrator for pessoa coletiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respetivos administradores, gerentes ou diretores.
Por esta razão, e por existir previsão legal para o efeito de regularizar estes milhares de cidadãos, vê como mais atentatória a previsão de aplicação de tais contraordenações, uma vez que o mesmo governo que se beneficia da sua arrecadação, é aquele que indisponibiliza o acesso à regularização destes migrantes.
E pior, tal situação não ocorreria no caso de um cidadão CPLP que tem necessidade de visto para Portugal, mesmo que para curta duração; logo não há que se falar em motivos ou condições da estada, que em ambos os casos, há a previsão legal que de suporte ao pedido.
Disto posto, depreende-se que em breve veremos milhares de empregadores a dispensar injustificadamente seus funcionários, ou a arriscar-se a bancarrota pela necessidade de mão de obra.
Neste mesmo norte, conscientes de que não há justificativas para a indisponibilidade de sistema que hoje se verifica, uma vez que o referido processo não depende de um agendamento prévio, tão pouco comparecimento presencial do Requerente, e por fim, é independente de disponibilidade de acesso e capacidade humana da AIMA para que possa vir a ocorrer.
Desta forma, solicita o desbloqueio do sistema de acesso ao registo no portal da CPLP por cidadãos não portadores de visto consular, conforme previsão legal do Artigo 87-A da Lei de Estrangeiros, ou a alteração da Lei de Estrangeiros para revogação (ou temporária suspensão) dos artigos 198.º e 198.º-A, de forma a extinguir as coimas relativas ao exercício profissional sem título de residência ou visto específico.
Nestes termos
Pede e espera deferimento.
Lisboa, 14 de junho de 2024.
Petição 42/XVI/1
Petição - Arquivada
Subscritor(es): Célio César Sauer Júnior
Primeiro subscritor: 1
Assinaturas entregues: 0
Assinaturas online: 1345
Total de assinaturas: 1346
Anexos
Texto
Informação adicional
- 2024-07-03: Nomeado o relator PEDRO NEVES DE SOUSA